Refugiados e imigrantes do país vizinho contam como é viver longe de sua terra natal
Com o desespero em sua costas e o medo do destino desconhecido à sua frente, mais de 82 milhões de pessoas têm sido forçadas a se deslocar pelo mundo em refúgio, indicam dados da Organização Internacional da Migração (OIM) e da Agência da ONU para Refugiados (ACNUR). Em situações generalizadas de violação de direitos humanos - seja por motivos políticos, econômicos, sociais ou religiosos -, elas fogem de situações insustentáveis à procura de um refúgio que lhes permita ter emprego e renda, com a esperança de poderem voltar à própria nação um dia.
“Não escolhemos ser imigrantes ou refugiados, as circunstâncias de um país em crise determinam essa condição. Mas sempre que você mostra para o país no qual se refugiou que veio para trabalhar e somar, eles te abraçam. Porém, todo imigrante sempre quer voltar. Não tem momento ou espaço nos pensamentos sobre não querer voltar para seu lar, o nosso coração está lá, mas precisamos ficar o suficiente para ter o que levar ao voltar para casa”, explica Harlet Orellan Urbina, venezuelana de 41 anos que está no Brasil desde 2020, junto com sua companheira, Nadiveth Duno Escalona.
Para ter renda em meio a pandemia, elas criaram As Meninas Venezuelanas (@asmeninasvenezuelanas), um negócio focado em pinturas de parede e efeitos decorativos. Elas firmaram parceria com uma designer de interiores e têm realizado até projetos comerciais, enquanto nos finais de semana são voluntárias do projeto Doutores da Reforma em Ação (@doutoresdareformaemacao), melhorando o lar de outras pessoas. “Podemos ter muitas necessidades, mas tem gente com ainda mais dificuldades. Há muita pobreza e desigualdade no Brasil, e oferecemos nossa sabedoria e mãos para essas pessoas”, explica Harlet.
De acordo com dados da ACNUR, a nacionalidade com maior número de pessoas refugiadas reconhecidas no Brasil, entre 2011 e 2020, é a venezuelana (46.412), seguida dos sírios (3.594) e congoleses (1.050). Dentre os solicitantes da condição de refugiado, as nacionalidades mais representativas foram os venezuelanos (60%), que saem da Venezuela por causa da situação política e econômica que torna a vida muito difícil, afirma a dona de casa Magdalys Maria Ravelo Salazar, 36 anos, que chegou a trabalhar nos Tribunais de Violência Contra a Mulher na Venezuela.
“Mas ficou muito difícil nos sustentar lá com a hiperinflação. Em 2017 chegamos em Boa Vista, capital de Roraima e dormimos dias na rua até conseguir vaga no abrigo da Adra (Agência Adventista de Desenvolvimento e Recursos Assistenciais). Já estávamos trabalhando e com casa alugada quando Roraima entrou em uma crise humanitária. Perdemos nossos empregos e pedimos interiorização a Adra, que encontrou trabalho para meu marido em Salvador. Hoje procuramos nos estabilizar e criar uma nova vida no Brasil”, conta Magdalys.
Chegar à fronteira, entrar no Brasil através da cidade de Pacaraima e seguir para a capital de Roraima, Boa Vista, é o caminho mais comum feito pelos refugiados venezuelanos. E foi o caminho feito pelo sargento do exército venezuelano Shair Samhir Solano Alcocer, 34 anos, que está no Brasil desde 2019, trabalha como diarista e afirma: ”sempre fui bem acolhido pelos irmãos brasileiros”.
Com um grande esforço e trabalhos precários, Shair conseguiu trazer boa parte da família para o Brasil e se diz muito feliz por não lembrar de nenhuma situação discriminatória que sua família tenha passado. Mas ele próprio não teve tanta sorte. “Quando cruzei a fronteira e consegui meus documentos, fuipara Manaus para ficar na casa de um amigo e logo comecei a trabalhar em um lava-jato onde me pagavam R$32 por semana, me faziam varrer o chão e até limpar a casa do dono, que não perdia a oportunidade de me humilhar com palavras. Passado um tempo ele me demitiu, mas ali aprendi a não deixar mais ninguém me humilhar daquela forma”, relembra.
Vilmarys del Carmen Maza Diaz, 35, era professora e também chegou ao Brasil em 2019, mas ao contrário de Shair, ainda tem muitos familiares na Venezuela. “Meu sonho é poder voltar para minha casa e abraçar toda a minha família que ficou lá. Eu amo meu país e amava meu emprego, mas tive que sair da Venezuela pois os nossos salários não estavam mais sustentando nossa família. Quando cheguei aqui com meu marido e filhos, todos foram muito acolhedores, especialmente aqui na Bahia, e recebemos muita ajuda da Adra, da ONU e da Polícia Federal, e é por causa dessas organizações que estamos aqui hoje”, afirma.
Matéria originalmente publicada no site A TARDE (12/02/2022). Por Priscila Dórea. Clique aqui para ver o texto original!